(शिवताण्डवस्तोत्रम्)
Traduzido do Sânscrito
Quem quer que procure na literatura religiosa do Hinduísmo uma obra breve e capaz de expressar, simultaneamente, a profunda devoção, o instinto místico e o apreço pela magia dos mantras, que tão profundamente agita as mentes dos seus seguidores, não encontrará melhor exemplo do que o pequeno hino a Shiva, no Seu aspeto de Mestre da Dança do Mundo, que conhecemos como o Śivatāṇḍavastotra: um hino atribuído ao grande rākṣasa, o Rei Rāvaṇa, de Laṅkā, o qual, segundo se diz, gerou, de forma espontânea, um dos mais belos e inspiradores strotas sanscríticos, enquanto venerava Shiva.
Na tradução, a métrica e o número do hino original sanscrítico foram mantidos, mas é totalmente impossível reproduzir em inglês as suas maravilhosas aliterações e onomatopeias sem que se perca a literalidade das suas ricas imagens. Para o adorador de Shiva, o Hino é quase a própria Dança do Senhor dos Ascetas, reproduzida na alma humana. Cantado por alguém que saiba sânscrito, este produz um efeito impressionante sobre os ouvintes, mesmo que estes possam não compreender o significado das palavras. Por forma a que o leitor ocidental possa sentir algo da canção, reproduzimos o primeiro verso, e também duas linhas do nono e décimo terceiro versos em caracteres romanos:
ja-ṭā-ṭa-vī-ga-laj-ja-la
pra-vā-ha-pā-vi-tas-tha-le
ga-le-va-laṁb-ya-laṁ-bi-tāṁ
bhu-jaṁ-ga-tuṁ-ga-mā-li-kām;
ḍa-maḍ-ḍa-maḍ-ḍa-maḍ-ḍa-man
ni-nā-da-vaḍ-ḍa-mar-va-yaṁ
ca-kā-ra-caṁ-ḍa-tāṁ-ḍa-vaṁ
ta-no-tu-naḥ-śi-vaḥ-śi-vam.
sma-rac-chi-daṁ-pu-rac-chi-daṁ
bha-vac-chi-daṁ-ma-khac-chi-daṁ
ga-jac-chi-dāṁ-dha-kac-chi-daṁ
ta-maṁ-ta-kac-chi-daṁ-bha-je
vi-lo-la-lo-la-lo-ca-nā
la-lā-ma-bhā-la-lag-na-kam
śi-vē-ti-maṁ-tra-muc-ca-ran
sa-dā-su-khī-bha-vām-ya-ham
Ó Senhor Auspicioso, propicia-nos,
Interprete da dança frenética;
Ó Portador do pequeno tambor
Batendo damad, damad, damad;
Tal como através da floresta dos Teus cabelos,
Desce o curso de água purificador
Até ao Teu pescoço, do qual pende
A Tua grinalda feita de reis-serpente.
Que possas ser Tu a nossa constante alegria,
Que o crescente da lua nova colocas;
Sobre cuja testa o fogo triplo
Arde ḍhagaḍ, ḍhagaḍ, ḍhagaḍ;
O Rio dos Cintilantes,
Revolto na montanha do Teu cabelo,
Como trepadeiras fustigadas pelo vento, ergue-se em ondas,
E à Tua cabeça concede glória.
Que possamos encontrar a bem-aventurança no Teu Ser,
Ó Tu, envolto pelo Espaço apenas;
Cuja mente se regozija com o olhar,
De soslaio e constante, fascinado pelo amor,
De Parvati, doce filha do
Senhor das Montanhas, Himavat;
Cujos olhos compassivos, dissipam
As nossas insuportáveis misérias.
Em Ti, Ó Mestre de toda a Vida
O meu coração extasiado alegria pode sentir;
Ó Tu, coberto pela suave veste –
A pele do demónio cegado pela paixão;
As fulvas serpentes, em cujos cabelos
Derramam, das joias dos seus capuzes,
Sobre os seus quatro belos rostos
Um brilho, como se lhes atirassem açafrão.
Ó Imenso, Portador de uma Caveira,
Que todos nós possamos prosperar em Ti;
Em cuja larga testa arde o fogo
Que com as suas faúlhas consumiu o deus
Do amor inferior; que foi obedecido
Por todos os líderes dos deuses;
Entre cujos cabelos o Ganges brinca;
Cuja joia superior brilha com os raios da lua
Que possas, Ó Tu que tens por Tiara a Lua,
Sê para nós as eternas riquezas;
Ó Tu, de cujo trono é o escabelo
Entapetado com o pólen disperso
Das flores que enfeitam as coroas de joias
De todos dos deuses, começando por Indra;
Cujo cabelo torcido em rolo está amarrado –
O Rei das serpentes rodeado a toda a volta.
Tu, o dos Três Olhos, sê o nosso deleite;
Tu, que delineaste, com a maior habilidade,
Raras figuras no peito da
Descendente do Senhor das Montanhas;
Sobre o altar da sua testa
Brilha ḍhagaḍ, ḍhagaḍ, ḍhagaḍ
O fogo no qual foi sacrificado
O caído deus do amor, o das cinco flechas.
Ó Tu, Sustentador dos Mundos,
Estende-nos as Tuas ricas bênçãos;
Ó Tu, cuja pele é adornada pelos raios da lua:
Tu, portador do Santo Diluvio;
Cujo pescoço, envolto na espessa escuridão
Como a meia-noite sem lua, surge
Entre as nuvens reunidas em círculo
A sua luz brilhante e insuperável
Eu Venero-Te, destruidor da morte;
Destruidor dos demónios sombrios,
Das três cidades, do deus do amor,
Do sacrifício, do nascimento e da morte.
Cuja graciosa garganta, semelhante ao caule da bananeira
Brilha sobre todo o Seu pescoço,
Assemelhando-se, com o seu esplendor sombrio,
O lótus azul totalmente florido.
Eu Venero-Te, destruidor da morte;
Destruidor dos demónios sombrios,
Das três cidades, do deus do amor,
Do sacrifício, do nascimento e da morte.
À roda da árvore de todas as artes,
Bem-aventurada, rica, enlaçada por trepadeiras
Cuja seiva flui como mel –
Tu és a abelha que o recolhe
Ó Shiva, Tu és Conquistador;
Intérprete da dança frenética,
Anunciado pelo Teu pequeno tambor
Que toca ḍhimin, ḍhimin, ḍhimin,
Com melodia sublime e grandiosa;
Enquanto na Tua terrível testa o fogo
Deflagra com o sopro da respiração
De serpentes que rodam velozmente.
Eu venero Shiva em todas as coisas;
O meu olho pousa igualmente sobre
uma pedra dura e o macio leito,
Uma serpente e um colar de pérolas,
Um diamante precioso e um pedaço
de terra, um amigo e um inimigo,
A simples erva e uma mulher com olhos de lótus,
O súditos e o sei poderoso rei.
Ó, quando é que não estou eu cheio de alegria?
De maus pensamentos se libertou a minha mente,
As minhas mãos ante a minha testa se uniram,
No sagrado porto do Ganges eu habito,
Repetindo sempre e eternamente
O mantra de Shiva claramente escrito
Na testa da sua Graça
A melhor das mulheres, Parvati.
Ó Tu, doador de alegria de dia e de noite,
Estende-nos o regalo nos nossos corações,
Ó Presença Brilhante, Senhor Supremo
Para Parvati, Rainha entre as mulheres.
Na terra de Indra, as belas donzelas
Usam cachos de jasmim no seu cabelo;
Deles, o pólen cai livremente
Exalando um bálsamo que Te agrada
Possa o mundo ser abençoado pelo
Teu bendito casamento musical,
Com o tema “Shiva Shiva”,
Quando Parvati de olhos doces é a noiva;
O som do qual, melodioso,
Cantado por mulheres dotadas de siddhis,
Destrói todos os males, mesmo que sejam perigosos
Como o fogo subaquático ardente.
Shiva é o primeiro membro da Trimurti Hindu, ou Trindade. Ele é o Destruidor e o Regenerador, e o Senhor dos Ascetas, envolto pelo Espaço. O cabelo emaranhado é sempre usado pelos Paramahamsas, que andam praticamente nus, embora, é claro, nenhum verdadeiro ocultista reproduza estes símbolos na sua pessoa.
Isto pode ser interpretado como um sinal de indiferença para com o mundo. Da cabeça brota o Ganges, o Sagrado Rio dos Devas – um rio purificador, novamente relacionado com a regeneração, ainda que num aspeto mais feminino ou gracioso.
O cabelo é atado e o pescoço enfeitado com serpentes, que são frequentemente usadas como símbolos de conexão com os Sábios do Caminho Sagrado. O fogo que arde sobre sobrancelhas consome tudo o que é de natureza transitória, incluindo o Deus do Amor – e, ainda assim, encontramos o amor humano usado como símbolo e, Parvati, provavelmente a manifestação mais profunda da Natureza, aparecendo constantemente como a Sua noiva.
A pele de tigre que Ele usa pode muito bem ser um símbolo da natureza de desejo destruída. Ele é o destruidor da Morte, dos três mundos, do ciclo de nascimentos e mortes e do sacrifício. Ele é Trilochana, O de três olhos, no centro da testa do qual está o terceiro olho, do qual nada fica oculto.
Ernest Wood.
S. V. Subrahmanyam.