Às vezes a vida passa lenta ou rapidamente, desliza silenciosa ou ruidosamente, até chegar a esse momento em que sabemos estar a aproximar-se do seu fim. Não fica muito por dizer, não fica muito por fazer… ou quem sabe, pelo contrário, há tantas coisas a gritar com viva-voz e calamos, tantas coisas a fazer, mas ante as quais o corpo já não responde.
Todo o ser vivo segue a mesma pauta e, a meu ver, também os grupos humanos, como conjuntos, vêm em vaga, em gerações que nascem juntas, crescem, amadurecem, dão o melhor de si como exuberantes frutos e finalmente murcham, caem e morrem. E também acontece com os Mestres, com as pessoas que tanto nos ensinaram, caminham ao nosso lado e ficamos como que órfãos, tristes e abandonados, melancólicos e, às vezes, temerosos.
Já aconteceu milhares de vezes, e continuará a acontecer, as vagas da vida e os seus mestres virão. Cada um desempenhará o seu papel e, então, a cortina cairá sobre a cena.
No tempo de Buda, talvez para alguns o maior ser humano que já viveu, também chegou o momento da Sua partida. Uma longa vida de peregrinação e de esforço estava a chegar ao fim e, apesar de ter alcançado o Nirvana quando era jovem, renunciou àquilo que todos desejamos, para continuar a ensinar-nos até a idade avançada.
As suas forças diminuíram e adoeceu. Depois de uma recuperação temporária, falou assim com o seu discípulo Ananda:
Pouco depois de o Buda ter recuperado da sua doença, saiu da sua habitação e sentou-se na sombra de um alpendre sobre um banco. Então, o venerável Ananda aproximou-se do Buda, inclinou-se e sentou-se ao seu lado e disse:
– Senhor, é maravilhoso que o Buda se sinta agora confortável e bem. Porque quando o Buda estava doente, o meu corpo parecia estar drogado. Estava desorientado e os ensinamentos não eram nada claros para mim. Pelo menos, consolava-me pensar que o Buda não se extinguirá completamente sem, pelo menos, deixar algumas indicações ao Sangha, a Assembleia dos monges mendicantes.
– Mas o que espera de mim a assembleia de mendicantes? Ensinei o Dharma sem fazer distinção entre os ensinamentos secretos e públicos. Quando se trata de ensinar, o iluminado não fecha o punho como um mestre qualquer. Se alguém pensa “Ficarei a cargo da Sangha dos Mendicantes” ou “A Sangha dos mendicantes está destinada a mim?” que faça, pois, uma declaração ao Sangha. No entanto, o iluminado não pensa desta maneira. Então, porque haveria de fazer uma declaração com respeito ao Sangha?
Agora já sou velho, sou maior e o mais antigo. Tenho uma idade avançada e cheguei à etapa final da vida. Agora tenho oitenta anos. Assim como um carro decrepito continua a funcionar apoiando-se em correntes, da mesma maneira o corpo do Realizado se mantém apoiado em correntes, ou isso se poderia pensar. Às vezes o Realizado, sem se focar em nenhum sinal particular e com a cessação de certos sentimentos, entra e permanece em imersão no coração sem dar sinais. Só então o corpo do Realizado é, momentaneamente, aliviado.
Assim sendo, Ananda, sê a tua própria ilha, o teu próprio refúgio, sem outro refúgio. Que os ensinamentos sejam a tua ilha e o teu refúgio, sem outro refúgio. E como pode fazer isto um monge mendicante? Quando um monge mendicante observa cada aspeto do corpo, perspicaz, consciente, atento, livre de desejo e aversão pelo mundo. Quando medita observando cada aspeto dos sentimentos, perspicaz, consciente, atento, livre de desejo e aversão pelo mundo. Quando contempla a mente, observando-a perspicaz, consciente, atento, livre de desejo e aversão pelo mundo.
É desta maneira que um monge mendicante se converte na sua própria ilha, no seu próprio refúgio, sem outro refúgio. É como se o seu ensinamento fosse a sua ilha, o seu refúgio, sem outro refúgio.
E seja agora ou depois de estar morto, qualquer um que viva sendo a sua própria ilha, o seu refúgio, sem outro refúgio, com o ensinamento enquanto a sua ilha e seu refúgio, sem outro refúgio, aqueles mendicantes meus que queiram praticá-lo estarão entre os melhores dos melhores. [a partir do Mahāparinibbānasutta]
Cada minuto que nos resta, cada segundo em que palpita o coração, anunciam a perda do mundo à nossa volta, que morre connosco. A quem acudirei? Oxalá tivesse um Mestre! Oxalá o Mestre seguisse vivo ao meu lado!
Mas se alguma vez estive realmente vivo foi quando ressoou com a tua Voz Interna, com esse outro Mestre que te acompanhará até ao último alento e ainda mais. E os versos, palavras, lições dos teus Mestres externos falarão todos em uníssono na tua memória interna, na tua própria Ilha, na Ilha Refúgio, na Câmara Secreta onde se guardam os ensinamentos.
Às vezes a vida passa lenta ou rapidamente, desliza silenciosa ou ruidosamente, até chegar a esse momento em que sabemos estar a aproximar-se do seu fim. Não fica muito por dizer, não fica muito por fazer… ou quem sabe, pelo contrário, há tantas coisas a gritar com viva-voz e calamos, tantas coisas a fazer, mas ante as quais o corpo já não responde.Todo o ser vivo segue a mesma pauta e, a meu ver, também os grupos humanos, como conjuntos, vêm em vaga, em gerações que nascem juntas, crescem, amadurecem, dão o melhor de si como exuberantes frutos e finalmente murcham, caem e morrem. E também acontece com os Mestres, com as pessoas que tanto nos ensinaram, caminham ao nosso lado e ficamos como que órfãos, tristes e abandonados, melancólicos e, às vezes, temerosos.
Já aconteceu milhares de vezes, e continuará a acontecer, as vagas da vida e os seus mestres virão. Cada um desempenhará o seu papel e, então, a cortina cairá sobre a cena.No tempo de Buda, talvez para alguns o maior ser humano que já viveu, também chegou o momento da Sua partida. Uma longa vida de peregrinação e de esforço estava a chegar ao fim e, apesar de ter alcançado o Nirvana quando era jovem, renunciou àquilo que todos desejamos, para continuar a ensinar-nos até a idade avançada.As suas forças diminuíram e adoeceu. Depois de uma recuperação temporária, falou assim com o seu discípulo Ananda:Pouco depois de o Buda ter recuperado da sua doença, saiu da sua habitação e sentou-se na sombra de um alpendre sobre um banco. Então, o venerável Ananda aproximou-se do Buda, inclinou-se e sentou-se ao seu lado e disse:
– Senhor, é maravilhoso que o Buda se sinta agora confortável e bem. Porque quando o Buda estava doente, o meu corpo parecia estar drogado. Estava desorientado e os ensinamentos não eram nada claros para mim. Pelo menos, consolava-me pensar que o Buda não se extinguirá completamente sem, pelo menos, deixar algumas indicações ao Sangha, a Assembleia dos monges mendicantes.– Mas o que espera de mim a assembleia de mendicantes? Ensinei o Dharma sem fazer distinção entre os ensinamentos secretos e públicos. Quando se trata de ensinar, o iluminado não fecha o punho como um mestre qualquer. Se alguém pensa “Ficarei a cargo da Sangha dos Mendicantes” ou “A Sangha dos mendicantes está destinada a mim?” que faça, pois, uma declaração ao Sangha. No entanto, o iluminado não pensa desta maneira. Então, porque haveria de fazer uma declaração com respeito ao Sangha?Agora já sou velho, sou maior e o mais antigo. Tenho uma idade avançada e cheguei à etapa final da vida. Agora tenho oitenta anos. Assim como um carro decrepito continua a funcionar apoiando-se em correntes, da mesma maneira o corpo do Realizado se mantém apoiado em correntes, ou isso se poderia pensar. Às vezes o Realizado, sem se focar em nenhum sinal particular e com a cessação de certos sentimentos, entra e permanece em imersão no coração sem dar sinais. Só então o corpo do Realizado é, momentaneamente, aliviado.Assim sendo, Ananda, sê a tua própria ilha, o teu próprio refúgio, sem outro refúgio. Que os ensinamentos sejam a tua ilha e o teu refúgio, sem outro refúgio. E como pode fazer isto um monge mendicante? Quando um monge mendicante observa cada aspeto do corpo, perspicaz, consciente, atento, livre de desejo e aversão pelo mundo. Quando medita observando cada aspeto dos sentimentos, perspicaz, consciente, atento, livre de desejo e aversão pelo mundo. Quando contempla a mente, observando-a perspicaz, consciente, atento, livre de desejo e aversão pelo mundo.É desta maneira que um monge mendicante se converte na sua própria ilha, no seu próprio refúgio, sem outro refúgio. É como se o seu ensinamento fosse a sua ilha, o seu refúgio, sem outro refúgio. E seja agora ou depois de estar morto, qualquer um que viva sendo a sua própria ilha, o seu refúgio, sem outro refúgio, com o ensinamento enquanto a sua ilha e seu refúgio, sem outro refúgio, aqueles mendicantes meus que queiram praticá-lo estarão entre os melhores dos melhores. [a partir do Mahāparinibbānasutta]
Cada minuto que nos resta, cada segundo em que palpita o coração, anunciam a perda do mundo à nossa volta, que morre connosco. A quem acudirei? Oxalá tivesse um Mestre! Oxalá o Mestre seguisse vivo ao meu lado!Mas se alguma vez estive realmente vivo foi quando ressoou com a tua Voz Interna, com esse outro Mestre que te acompanhará até ao último alento e ainda mais. E os versos, palavras, lições dos teus Mestres externos falarão todos em uníssono na tua memória interna, na tua própria Ilha, na Ilha Refúgio, na Câmara Secreta onde se guardam os ensinamentos.